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segunda-feira, 9 de março de 2015

A Guarda da Rainha - Parte 2


  Antes de iniciar a leitura, certifique-se de ter lido a parte 1.

  Eu estava hesitante em chamar a polícia após aquela seja-lá-o-que-ela-for insana deixar meu apartamento, mas minha namorada não. Os policiais chegaram na nossa residência após uns 20 minutos. Registraram nossos depoimentos, anotaram a descrição da mulher, e nos pediram para ligar imediatamente caso algo estranho acontecesse.

 Mas minha mente estava em outro lugar. Meu patrão. Ele me mandou não falar com ela. Mas eu falei.  Além de que eu acordei na cama com ela, e não tenho ideia de como ela conseguir invadir minha casa, merda, cara, eram pensamentos demais.

  No dia seguinte eu fui ao escritório do comandante.

  "Senhor", eu disse muito cuidadosamente - você tem de entender que eu poderia perder aquele emprego, não importa o quão escroto ele fosse, ser demitido não estava na minha lista de tarefas - "Senhor, precisamos conversar."

  Ele me encarou de sua escrivaninha e eu juro, tenho certeza de que ele já sabia. Seu rosto perdeu toda a expressão. Ele nem sequer perguntou o que estava acontecendo. "Sente-se", ele disse enquanto se recostava na poltrona.

  "Senhor, eu..." Eu estava tendo muita dificuldade para confessar que havia quebrado as regras da Guarda da Rainha.

  "Você falou com ela. Você reagiu." Ele disse enquanto se inclinava em minha direção. "Não foi?"

  "Bem, eu só pedi para que ela saísse do meu caminho, só isso."

  "Não, não a comanda da Guarda. Você disse alguma coisa além daquilo?"

"Sim." E eu repeti a forma como eu pedi, conseguindo manter a educação apesar do desespero, para que ela fosse embora.

  "Que merda, filho. Puta merda."

  Aquela foi a primeira vez em que eu ouvi meu comandante falar um palavrão.

  "Senhor, quem é aquela mulher?"

  "Eu vou agendar seu arquivo para remoção imediata da Guarda", ele me ignorou enquanto abria a gaveta para procurar alguma coisa.

  "Senhor?", eu disse, sem conseguir acreditar que estava prestes a perder meu emprego.

  "Não se preocupe, lhe encontrarei outra coisa para fazer. Mas seus dias na Guarda acabaram. Você será transferido em cerca de uma semana."

  "Senhor, mas eu apenas..."

  "É isso, filho, está dispensado." Ele retrucou, sem sequer me olhar.

  Eu fiquei furioso. Mas de qualquer maneira, se eu iria receber o salário sem precisar ficar parado na rua e lidar com turistas/criaturas doidas do caralho, eu estava bem.

  O novo horário veio e, quem diria, eu estava agendado para trabalhar apenas por um turno naquela semana. Aquilo seria bem útil porque eu tinha de cuidar da minha sobrinha de 7 anos que vinha de Birmingham,  e eu já havia planejado um fim de semana inteiro com ela.

  Quinta-feira chegou sem nenhum outro incidente com a maluca-da-boca-aberta. Minha namorada havia finalmente se acalmado. Ela retornou para Amsterdã naquela manhã, de bom humor. A vida estava voltando ao normal.

  Naquele dia, meu turno era das 6 às 10 da noite diante do palácio St. James. Costumam haver dois de nós trabalhando aqui, mas por alguma razão, eu estava designado para servir sozinho das 9 às 10. Há uma casinha de madeira na qual nos abrigamos caso chova (como a da foto acima).

  "Ok, amigo, quase lá, aguente aí." Meu colega disse enquanto marchava para dentro, me deixando completamente só.

 Apenas mais uma hora. Uma última hora deste maldito emprego e eu estarei livre... Deus, a sensação é ótima, eu pensei enquanto ficava parado diante do meu posto. A noite estava anormalmente quieta, mas começava a garoar, então acho que era de se esperar. 9:30. Ainda aquele chuvisco, tudo continuava entediante pra caralho. Quase lá. 9:45. A chuva estava aumentando, portanto decidi passar o resto do tempo no abrigo.

  Eu me virei.

  Não deveria ter feito isso.

  Lá estava ela.

  Se eu fosse escritor, eu utilizaria todos aqueles métodos descritivos para recriar uma imagem do quão aterrorizante a mulher estava naquela noite. Mas deixe-me resumir, aquela foi a coisa mais horrível que eu já vi, e olhe que eu já assisti a uma criança sendo explodida por uma bomba.

  A mulher estava bloqueando a porta da casinha. Ela usava um vestido branco que, de tão ofuscante, quase brilhava no escuro. Mas o rosto dela, meu deus, o rosto dela. Ela não estava sequer me olhando, o que de alguma maneira apenas piorava as coisas. Ela encarava o céu ou qualquer outra parada que pudesse estar lá em cima, e seu olhos estavam tão revirados para o alto que eu só conseguia ver a ponta de suas pupilas. A boca estava tão escancarada, que eu tinha praticamente certeza de que era humanamente impossível fazer aquilo.

  Há algo muito surreal sobre ficar diante de uma pessoa que não age racionalmente. Quero dizer, se você está sendo assaltado, você sabe que o bandido quer o seu dinheiro. Ou se você leva um tiro, você sabe que o atacante quer te matar. Mas o verdadeiro terror vinha do fato de que eu não tinha a mínima ideia do que o que aquela mulher queria de mim.

  9:49. Ok, mais 11 minutos daquilo e eu poderia finalmente... Ela deu um passo em minha direção. Em seguida outro. Poucos centímetros à distância, ela parou.

  Ela começou a se inclinar. Aquela porra de inclinação. Seu rosto apenas parou, quase colado ao meu. Inicialmente sua cabeça começou a balançar devagar, mas então foi acelerando. Era um tipo comum de movimento, como eu já havia descrito, aquela tremedeira de quando você sai do banho e entra em um quarto com ar-condicionado. As pupilas estavam tão no topo, que eu mal podia vê-las. Sua cabeça estava agora tremendo tanto que eu perguntava como aquilo era possível. E aquela boca, cara, aquela boca estava irreal, absurdamente aberta. Eu juro que vi os cantos de seus lábios começarem a sangrar porque sua pele não suportava aquele esforço.

  Nenhum som.

  A rua estava tão silenciosa, provavelmente a maior ausência de ruído que eu já presenciara. E a pior parte é que estava de noite. Eu sei que eu digo muito isso, mas apenas imagine uma última vez - você está parado imóvel no meio de um local deserto, e há uma mulher insana com a boca escancarada na sua frente, à centímetros da sua cara, fazendo seja-lá-o-que-diabos ela esteja fazendo, e não há sequer uma outra alma-viva à vista. E sem qualquer barulho também.

  9:54.

  Puta que pariu, qual é?

  E então, como se ela houvesse ouvido o que eu pensei, sua pupilas baixaram e passaram e me olhar diretamente. Eu quase pulei para trás. Ela fechou a boca, e eu não acredito que estou dizendo isso, mas eu preferiria que ela a tivesse mantido aberta. Sua mandíbula começou a abrir e fechar rapidamente, como se ela estivesse mastigando algo invisível. Seus dentes batiam uns contra os outros tão forte, que eu tinha certeza de que eles iriam quebrar.

  Aquilo era o suficiente para mim, eu não aguentaria mais.

  Eu recuei e gritei "SÓ PARE COM ESSA MERDA DE UMA VEZ!"

  E ela obedeceu. Os dentes pararam de se chocar, os lábios se mantiveram cerrados, e ela voltou à posição original. Ela deu mais um passo em minha direção e, pela primeira vez, sorriu.

  "4, 3, 2, 1, 4, 3, 2, 1, 4, 3, 2 ,1." Ela começou a sussurrar, sem nunca perder o sorriso.

"Que porra é essa, que porra é essa?" Eu repetia, desesperado. Eu estava pronto para agarrá-la, sacudi-la, qualquer coisa, apenas para conseguir uma resposta. O que diabos ela queria de mim?

  9:58.

  "QUE PORRA, DIGO EU!" Disse uma voz atrás de mim.

  Meu comandante.

  Ele correu em minha direção, ignorando completamente a vadia louca que continuava lá.

  "Você falou com ela?"

  "Eu..."

  "VOCÊ FALOU COM ELA, CARALHO?" Ele berrou mais alto enquanto puxava meu uniforme. Ele nem sequer reparava na mulher.

  "Sim."

  "Jesus Cristo... Que número?" Ele disse enquanto finalmente me libertava de seus punhos.

  Ela então se virou para ele, e mesmo de trás, eu poderia ver sua boca se escancarando novamente.

  "Vá, apenas vá." O comandante me pediu enquanto me olhava. Ele estava evitando encará-la. Eu podia ouvir os dentes dela rangendo mais uma vez.

  "Não posso simplesmente te abandonar aqui." Eu disse.

  "Vá, e não volte mais. Eu cuidarei disto."

  Sabe, eu gosto de me considerar uma pessoa corajosa, mas naquele momento, tudo o que eu queria fazer era ir embora. Eu espero que você não me culpe por isso. Então, eu comecei a fugir.

  "E nunca mais fale com ela novamente!" Pude ouvir o comandante gritar ao longe enquanto eu me afastava correndo.

  Agora, sei que muitas coisas aqui soam como pura baboseira. E parecem mesmo. Certo, olhando para trás eu poderia tê-la prendido, caralho, eu poderia ter até matado aquela doida, e o comandante também. Mas sabe de uma coisa? Quando você se encontra em uma situação tão impossível e surreal quanto aquela, você não age racionalmente nem pensa logicamente como faria em um momento normal. Eu fui para casa, tomei um banho frio (depois de me certificar duas vezes de que havia trancado todas as portas) e colapsei na cama.

  Na manhã seguinte eu mandei uma mensagem de texto para meu colega perguntando se estava tudo bem com o comandante e ele respondeu, "Claro, por que não estaria?" Era tudo o que eu precisava saber, e eu estava livre daquela vida.


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3 comentários:

  1. Uma das melhores series do blog. Não me importaria se postassem a 3ª parte agora mesmo...

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  2. Essa creepy e realmente muito boa cara dá mô tensão!

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  3. Muito boa !
    Mistérios sempre são os melhores...

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