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segunda-feira, 23 de junho de 2014

Mãe Natureza


Tudo começou quando uma flor nasceu do concreto. Quando o ser humano conseguiu artificializar toda a paisagem que já foi mapeada, uma única flor nasceu do concreto. E dela se originaram outros ramos, que logo se tornaram uma árvore colossal destacando-se no meio da paisagem cinzenta de uma grande cidade urbana.


 Ninguém sabia identificar qual era a espécie daquela árvore. Parecia um baobá, mas no ano de 2358 essas árvores estavam extintas há centenas de anos. As pessoas viajavam o mundo para conhecer uma única árvore. Em uma época como aquela, era uma verdadeira raridade, um milagre.

 A humanidade sobrepusera a natureza para a sua vantagem – assim que os cientistas descobriram como produzir oxigênio artificial e papel, ninguém mais precisava das florestas. Exploramos tudo até o âmago, e quando finalmente acabou, não fez diferença. O Planeta Terra não era mais azul, nem verde, agora variava entre tons de cinza.

 Mesmo assim, era incrível e fascinante poder ver e tocar uma árvore vistosa como aquela. Os mais jovens nem sabiam o que era aquilo. Mas logo surgiram outras como ela, sempre em grandes núcleos urbanos, a fonte da artificialidade. Elas eram mais altas que os maiores arranha-céus já construídos.

 A madeira que compunha seus grossos troncos seria de extrema utilidade, porém ninguém conseguia cortá-las. Mesmo usando os melhores equipamentos, a casca natural que as protegia era totalmente impenetrável. E havia outro problema: quando alguém golpeava uma dessas árvores, elas pareciam agredir de volta. A pessoa acordava no dia seguinte com hematomas. E às vezes, sangrando profusamente. Os tão poderosos humanos se intimidaram e decidiram respeitar as plantas, para o seu próprio bem.


Porém, elas estavam cada vez mais numerosas e provocaram uma verdadeira competição de espaço. Suas folhagens, tão volumosas e altas, começaram a bloquear a luz solar, obstruindo a iluminação que ninguém jamais percebera o quanto fazia falta. As cidades, tão padronizadas em sua estrutura elaborada em plástico, começaram a regredir a selva que já haviam sido a milênios. As pessoas se incomodavam e queixavam-se a um governo capitalista e instável que não poderia fazer nada na prática.

As árvores penetravam em qualquer barreira. Invadiam as casas. Impediam a vida das pessoas. Além de que elas não cresciam mais da forma que chamaríamos de natural. Uma singela florzinha que brotou em um quintal se transformaria em uma árvore gigantesca de um dia para o outro.

 A vida foi ficando insuportável. Era por isso que o ser humano eliminara o verde: não havia espaço para os dois no nosso mísero planeta. O mais forte predominava. Porém, ninguém poderia prever que a natureza mostraria a outra face depois de parecer totalmente aniquilada.

Só tiveram noção da gravidade da situação quando uma jovem garota deu entrada em um hospital. Marcas estranhas surgiam em suas pernas. Eram esverdeadas, semelhantes a veias grossas... Raízes. Logo ela entrou em coma e foi deixada em observação, pois ninguém conseguira diagnosticar aquilo. O impossível aconteceu: começaram a crescer galhos de seus dedos. Seu longo cabelo escuro se transformou em folhas verdes e saudáveis. A garota estava simplesmente se metamorfoseando em uma árvore.

 A situação ficara séria. Inimaginável. A Natureza estava se vingando dos humanos. Tomando o que lhe foi tomado. O mais sábio a fazer era abandonar o território que era da Natureza por direito.

 A tecnologia avançada da época permitia aos cientistas criarem naves espaciais tão grandes que poderiam abrigar nações, então a única solução foi empacotar toda a população da face da Terra em aeronaves e partir para o espaço. O planeta foi deixado para trás e os seres humanos observaram de longe, incapacitados, enquanto o verde cobria todo o cinza.

Mas não era o apocalipse. Era um recomeço.

Quem olhasse com atenção poderia ver um rosto sorridente se destacando na densa mata. Era a Mãe Natureza abraçando a sua cria.

3 comentários:

  1. Excelente crítica ao desmatamento. Um futuro quase apocalíptico - para nós - como esse é tão possível quanto um apocalipse zumbi. Gostei.

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  2. Fantástico! Nunca havia comentado em algum post, apesar de acompanhar o blog há algum tempo, mas não pude não fazê-lo neste. Absoluta e simplesmente genial. Meus parabens!

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