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segunda-feira, 13 de julho de 2015

Luz dos Olhos


  As outras pessoas dizem tê-la percebido mais cedo do que eu. Viciados em games e redes sociais que passavam o dia todo encarando monitores foram os primeiros a menciona-la.

  Começou com aparelhos eletrônicos. Tantos de nós esfregávamos nossos olhos, nos perguntando porque nossas telas pareciam estar cada vez mais escuras. Foram milhares de idas ao oftalmologista, não parecia haver qualquer coisa errada com os olhos das pessoas. Muitos suspeitaram de um vírus de computador que poderia infectar a tudo, ou da CIA, ou de aliens. Técnicos de informática insistiam que os computadores, TVs e e outros eletrônicos continuavam funcionando perfeitamente bem.

  Logo depois, passou a afetar as luzes. Lâmpadas comuns e fluorescentes estavam rapidamente perdendo seu brilho. De forma lenta mas persistente, a escuridão começou a infiltrar-se nelas e não havia conserto ou troca de lâmpadas que pudesse fazer voltar a ser possível que as pessoas trabalhassem à noite.

  Foi quando o terror se instalou definitivamente. Várias empresas foram obrigadas a fechar as portas à medida em que escurecia. Hospitais passaram a ter de funcionar arriscadamente à luz da lua, durante emergências. Muitas vidas foram perdidas, especialmente quando motoristas dirigiam à noite com nada além de uma luz mortiça para guia-los pela estrada. Eletrônicos foram trocados por velas e lamparinas, pois o brilho das chamas era o único que o olho humano ainda era capaz de suportar.

  Milhões morreram. Talvez bilhões. Era difícil de afirmar agora que a comunicação global ficava tão limitada.

  Companhias esforçavam-se em vão para criar alguma tecnologia que não precisasse ser vista para ser usada, mas na maior parte foram apenas tentativas infrutíferas.

  Noite passada, quando sentei para escrever este texto, eu percebi pela primeira vez que a chama da vela parecia atenuada. A luz conseguia apenas alcançar as bordas do papel, quando deveria estar preenchendo todo o quarto.

  Hoje, enquanto leio minhas próprias palavras, pergunto-me por quanto tempo ainda serei capaz de ler qualquer coisa. À medida em que o sol ilumina o amanhecer, não posso fazer nada além de encará-lo. Nossa última luz. Nossa última forma de escapar da escuridão. Apesar de que ele surge coberto por uma grande nuvem, o céu parece estar bem claro.

  Eu esfrego meus olhos.

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