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domingo, 5 de junho de 2016

Já foi tarde


"Mamãe, eu quero apertar o botão." Seu dedo rechonchudo pairava sobre o interruptor.

"Espere, querido. Deixe eu terminar de encher." Ela enfiou o resto do lixo dentro da boca do compactador. "Ok, vá em frente".

Lucas ligou o interruptor e ouviu com satisfação enquanto o compactador zumbia e esmagava. A mãe sorriu carinhosamente para ele.

"Já foi tarde", ela disse, como sempre. Era o pequeno ritual deles.

Ela caminhou ao lado de Lucas pelo corredor até o quarto de brinquedos, levando a bebê no colo. Ela deixou a bebê no meio do quarto e disse a eles: "Comportem-se". Então ela desapareceu em seu quarto, tirando o celular do bolso enquanto fechava a porta. Lucas conseguia ouvir sua voz abafada do outro lado da parede.

"Oi, Lisa... É, a bebê acabou de acordar de sua soneca, ela e Lucas estão brincando. Acho que ela deve estar na primeira dentição..."

Lucas desviou sua atenção para a torre de lego que estava construindo no chão. Ele franziu o cenho de concentração enquanto juntava as peças cada vez mais alto.

"Ah, eu sei... Consegue acreditar que ela disse aquilo? Bem no meio do jantar dos Robinsons, não podia nem esperar até chegar em casa..."

A bebê engatinhou pelo chão até onde Lucas estava sentado. Ela pegou um dos caminhõezinhos dele e colocou na boca, com a baba escorrendo até o queixo. Lucas o arrancou de volta, fazendo-a chorar.

"Espere, Lisa, estou ouvindo a bebê." A porta se abriu. "Lucas! O que está acontecendo aqui?" A mãe repreendeu.

"Ela pegou meu caminhãozinho", ele respondeu, apontando para o brinquedo gosmento.

"Você é um menino grande," ela disse severamente. "Ela é só um bebezinho. Eu mandei se comportar." Ela voltou para o quarto, fechando a porta.

"Então... É, eles estão bem. Então eu acho que ela realmente vai deixá-lo, não é? Bem, provavelmente vai ser melhor assim." A voz da mãe podia ser ouvida ao fundo enquanto Lucas lançava um olhar sombrio para a irmãzinha. Pela centésima vez, ele desejou que ela nunca houvesse nascido. Tudo o que ela fazia era chorar, cagar e estragar as coisas dele.

Como se lesse sua mente, a bebê deslizou para frente e com uma gargalhada de alegria, derrubou a torre dele. Ele abriu a boca para gritar com ela, então calou-se quando pensou na mãe e em seu olhar de desaprovação sempre que ele se enfurecia com a irmã. Lágrimas quentes de frustração preencheram seus olhos. A voz da mãe voltava a flutuar através da parede.

“Eu sei. Ela é uma verdadeira destruidora de lares. E ela ainda consegue chorar por causa disso! Eu juro, tudo o que ela faz é chorar. Bem, já foi tarde, é tudo o que eu posso dizer.”

Lucas olhou para a bebê com um ar pensativo. Será que sua mãe sentia-se da mesma forma? As palavras dela ecoavam em sua mente. Já foi tarde. Ele pegou a bebê, sentindo seu leve peso que parecia grande em seus braços infantis. Ele a carregou pelo corredor até a cozinha. Abriu o compactador de lixo. A bebê balbuciou para ele, com seus olhos azuis arregalados observando enquanto ele fechava a entrada e apertava o botão. O ruído satisfatório de algo sendo esmagado, um grito que logo cessou, os passos da mãe correndo pelo corredor. Ele esperava que ela se sentisse orgulhosa.

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